Rosental Alves: “O jornalismo é um dos pilares da democracia.”

O especialista brasileiro Rosental Alves , diretor do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, afirmou que a Inteligência Artificial muda a forma como as notícias são produzidas e os hábitos de consumo da sociedade.
"Tudo no jornalismo está mudando", afirmou Alves. Ele acrescentou que se trata de uma "faca de dois gumes", com benefícios para a produção de mais histórias e mais informações, mas com potencial significativo para manipular o público "para fins econômicos ou políticos".
Ele disse isso durante sua visita à Argentina, durante a série Inovação, Tecnologia e Jornalismo do programa 5G Newsrooms, organizado pela Telecom Argentina, em sua apresentação, intitulada "Jornalismo diante de um novo ecossistema de mídia: depois da web, a IA muda tudo novamente".
"O primeiro passo para a sobrevivência da mídia, diante da perspectiva de uma nova e massiva disrupção como a que estamos vendo começar com a Inteligência Artificial, é justamente reconhecer as reais dimensões e o potencial alcance das mudanças que virão . Fazer o que estamos fazendo aqui — dialogando, explorando cenários, treinando, nos preparando — disse Alves.
"Assim como o jornalismo reagiu à primeira onda de choque epistemológico, quando teve que se transformar em resposta à chegada da internet, agora certamente o enfrentará bravamente na era da Inteligência Artificial, fortalecendo-se ainda mais como trincheira na guerra pelos fatos, pela verdade, pela autenticidade e pela defesa do interesse público", destacou o especialista brasileiro, professor da Universidade do Texas, nos Estados Unidos.
"A Inteligência Artificial não pode ser ignorada. A alternativa é a morte. O ambiente midiático pode mudar de muitas maneiras, mas a melhor profissão do mundo continuará sendo um dos pilares da democracia , um bem comum para o desenvolvimento da humanidade", acrescentou Alves.
Julieta Schulkin, Pedro López Matheu, Rosental Alves, Hernán Cappiello e Gonzalo Abascal, na série Inovação, Tecnologia e Jornalismo, da Telecom Argentina.
O ciclo foi aberto por Pedro López Matheu, Diretor de Comunicação Externa, Sustentabilidade e Mídia da Telecom Argentina (empresa 40% detida pela CVH, acionista do Grupo Clarín).
“Nosso desafio é continuar apoiando o trabalho jornalístico diante das fronteiras tecnológicas emergentes, contribuindo para a sustentabilidade dos meios de comunicação, convencidos do papel essencial que eles desempenham na democracia”, disse López Matheu.
A apresentação ocorreu nesta segunda-feira, diante de mais de 100 jornalistas no auditório da Telecom Argentina. O painel também contou com a presença de Gonzalo Abascal, secretário editorial do Clarín; e Hernán Cappielo , editor do La Nación e diretor do Programa de Bacharelado em Comunicação Jornalística (UCA); a mediação ficou a cargo da jornalista Julieta Schulkin.
"O que sempre distinguiu a mídia não foi apenas a informação, mas a construção de uma voz única. Ninguém lia um jornal apenas para saber o que estava acontecendo, mesmo que vendesse 600 mil exemplares. O que existia era uma voz, um hábito, um ritual, um diálogo entre a mídia e o leitor, no qual o leitor sentia que a mídia estava falando com ele", disse Abascal. Ele acrescentou: "Espero que isso continue. E aqueles que sobreviverão serão aqueles que conseguirem construir essa voz única, para que o leitor acredite que ela está falando diretamente com ele."
Por sua vez, Cappiello sustentou que "a mídia tem uma atitude vergonhosa ao dizer que usa ferramentas de Inteligência Artificial. Acho que eles precisam dizer isso e deixar seu público saber que esse conteúdo foi gerado por IA, como parte do processo de alfabetização midiática". Ele perguntou a Rosental se o jornalismo precisará fortalecer seus métodos investigativos e de checagem de fontes, que a Inteligência Artificial não oferece.
"Um jornalista americano disse que você tem que tratar a Inteligência Artificial como se fosse um estagiário a quem você pode delegar uma tarefa, mas não vai usá-la diretamente para publicar, porque é aprendizado. Você a usa para complementar, para torná-la mais eficiente, mas não para substituir o trabalho jornalístico", respondeu Alves.
Entre as perguntas do público presente no debate, o especialista brasileiro foi questionado sobre "os ataques fortíssimos de Trump à imprensa, e Milei, que diz que não odiamos jornalistas o suficiente. Que recomendação o senhor daria diante de um ataque tão forte de um ator governamental?"
"Vemos um ataque frontal à democracia. A tendência autoritária de Trump, que ignora todas as normas, é um processo muito destrutivo, e uma das primeiras medidas tomadas por esses governos nos países onde isso ocorre é atacar a imprensa, para que as pessoas não acreditem nos jornalistas. Além disso, essas pessoas com tendências autoritárias acreditam que o jornalismo é desnecessário porque os poderosos querem falar diretamente com o seu povo, sem intermediários. Este é um momento muito importante para defender o jornalismo. Mas não podemos usar as mesmas armas que eles; confiamos na verdade verificada", respondeu Alves ao final do debate.
Clarin